Por Beatriz Dainese e Andrea Giugliani, da Giugliani Advogados
A intenção de disciplinar a figura do investidor-anjo surgiu para incentivar as atividades de inovação e os investimentos produtivos. Passam essas sociedades, nos termos da Lei Complementar 155/2016, a ter a opção de admitir o aporte de capital dos denominados investidores-anjos, cujo aporte não integrará o capital social da empresa, bem como esse investidor não fará parte do quadro societário da mesma. De outro lado, a empresa e o investidor-anjo, necessariamente, terão de firmar compromisso – contrato de participação.
A LC 155/2016 trouxe inúmeros benefícios para os pequenos negócios e para os investidores-anjos, pois permitiu que esses investissem nos novos e pequenos negócios sem a responsabilidade de serem efetivamente um sócio, bem como o benefício de não tributarem os rendimentos auferidos através dessa empresa investida.
Ocorre que algumas condições para os investidores-anjos foram alteradas por conta da Instrução Normativa (IN) 1719/2017, da Receita Federal do Brasil (RFB). O ponto de destaque dessa IN refere-se aos rendimentos decorrentes dos aportes de capital do investidor-anjo, que passam a se sujeitar à incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF), com alíquotas entre 22,5% a 15%, a depender do prazo do contrato.
A partir de agora, quaisquer dos rendimentos que resultarem de aportes estarão sujeitos à incidência do Imposto de Renda retido na fonte. Via de regra incidirá a alíquota mínima de 15%.
Na hipótese do investidor-anjo alienar a titularidade dos direitos do contrato de participação, incidirá Imposto de renda pelas alíquotas regressivas com o tempo calculado entre a data do aporte e a data da alienação dos direitos. Para os fundos de investimentos ficam dispensadas as retenções do Imposto de Renda nas operações do fundo – Todavia, no resgate das cotas aplicam-se as regras estabelecidas para os fundos de investimentos regidos por norma geral ou as regras estabelecidas para os fundos de investimentos constituídos sob a forma de condomínio fechado.
Verifica-se que referida disposição equiparou os rendimentos dos investidores-anjos aos de aplicações financeiras. Conforme a Instrução Normativa 1585/2015, os rendimentos das aplicações financeiras, auferidos por qualquer beneficiário, estão sujeitos à incidência do Imposto de Renda na fonte no momento do seu pagamento, portanto, que há um tratamento tributário mais gravoso conferido à participação nos resultados recebida pelo investidor-anjo, do que aquele dispensado aos dividendos distribuídos aos sócios da empresa investida.
Isso porque consideram-se isentos do Imposto de Renda – na fonte e na Declaração de Ajuste Anual do beneficiário – os valores efetivamente recebidos a título de lucros distribuídos de sociedades empresárias. Apenas os valores pagos a título de pró-labore, aluguéis ou serviços prestados são normalmente tributados pelo Imposto de Renda na fonte. Dessa forma, em que pese esse investidor-anjo não arcar com o risco do negócio da empresa investida e dos prejuízos que o mesmo venha a sofrer por não pertencer ao quadro societário, passou a ser tributado no que tange aos recebimentos auferidos desse contrato de participação; o que, por si só, constitui um empecilho para que as startups possam se desenvolver. Assim, há entendimento de que a natureza do contrato de participação é de tal risco e tal imprevisibilidade de retorno, não apenas pelo risco de crédito, mas também pela limitação imposta pelo parágrafo 7.º do artigo 61-A da LC 155/2016, que eventual ganho auferido pelo investidor-anjo, seja no resgate, seja na alienação a terceiro, não deveria ser tributado.
Por outro lado, a RFB sustenta que a principal expectativa do aporte do investidor-anjo é que haja um retorno financeiro extraordinário. Diferentemente de investimentos em títulos de renda fixa ou investimentos em empresas consolidadas, o principal objetivo do investidor-anjo é entrar em negócios de altíssimo risco (empresas nascentes no setor de inovação) e que, por sua natureza disruptiva, trazem a possibilidade de um retorno muito maior do que as expectativas gerais de mercado, o que por si só viabiliza a equiparação para fins de tributação.
Da forma com que foi feita através da IN 1719/2017, ao prever a incidência de Imposto de Renda retido na fonte sob as alíquotas progressivas de 15% a 22,5%, houve a criação de um tributo não previsto anteriormente. Vale dizer que quanto a esse ponto, a IN 1719/2017 é questionável uma vez que o meio que a União, os Estados e Municípios possuem para criar os tributos se dá por meio da lei ordinária. No presente caso, não estamos perante nenhuma das hipóteses excepcionais previstas na Constituição Federal – o que, por si só, torna absolutamente questionável a previsão da tributação do investidor-anjo por meio de Instrução Normativa.