Analisando a evolução tecnológica que estamos vivenciando e que podemos classificar como a “Quarta Revolução Industrial”, nos deparamos com oportunidades e os desafios para as empresas, especialmente, para as do setor de telecomunicações.
Para contextualizar, vale lembrar que, se na primeira Revolução Industrial, iniciada na Inglaterra na segunda metade do século XV, houve a transição dos processos de manufatura impulsionados pela utilização da água, carvão e vapor. Já na segunda etapa, o foco foi o uso do aço, metalurgia, eletricidade, eletromecânica, e ainda sistemas de trabalho baseados nos modelos fordista e taylorista, impulsionadores da fabricação em massa. A Terceira Revolução Industrial deu início ao uso intensivo de computadores e os avanços da tecnologia da informação e da produção de automação. Podemos considerar que o momento em que vivenciamos hoje, a quarta etapa, baseia-se e será conduzida pela transformação digital, internet das coisas, robotização, inteligência artificial e pelos adventos derivados de dispositivos tecnológicos nos diversos setores estratégicos para o país, como por exemplo, o setor de saúde, energia e transporte.
Vivemos em um período de “fusão de tecnologias que transcendem as esferas física, digital e biológica”, conforme definido pelo fundador e presidente executivo do Fórum Econômico Mundial, Klaus Schwab, em um discurso recente.
Evidentemente que essa nova etapa gerará um impacto importante na sociedade e na economia. Diante disso, como acontece em todo momento disruptivo importante, dada a dependência de conectividade entre bilhões de dispositivos e pessoas, ela aparece como uma oportunidade imensa para a as empresas de telecomunicações, e de maneira mais radical, permitirá que aconteça.
Entretanto, para que essa promessa se torne realidade, os provedores de serviços e as operadoras de telecomunicações, principais atores desse novo cenário, precisam se transformar digitalmente. Dessa forma, devem oferecer uma nova gama de serviços para os clientes suportados por redes eficientes, automatizadas e com capacidade de transmissão de dados que permitam que vários parceiros se unam para criar novos modelos de negócios.
Para se ter uma ideia, o novo ecossistema móvel (com maior escalabilidade), que se aventa, representará uma contribuição de 4,6 trilhões de dólares no PIB global em 2022, segundo a pesquisa da GSMA (The Mobile Economy 2018), impulsionados principalmente por conexões entre máquinas e internet das coisas.
Por outro lado, ainda não se sabe exatamente quais novas demandas serão geradas com essa receita, estando ainda o caminho muito nebuloso o que de fato posiciona o tema como maior desafio da indústria para os próximos cinco anos. Mas sem dúvida alguma, o tema englobará uma mistura de produtos e serviços, como saúde, conteúdo e mídia, veículos autônomos, cidades inteligentes etc. O que se sabe é que maioria dessas novas oportunidades transformará o negócio e a maneira de relacionamento e interação com os clientes de forma jamais vista, demandará a união de diversos parceiros em uma única plataforma de negócios em que o cliente não terá conhecimento tácito de quem está realmente fornecendo qual parte do serviço. No entanto, apesar dessa impessoalidade, as principaispreocupações serão a experiência do consumidor e a entrega de ponta a ponta do serviço pelo qual ele pagou. Trata-se assim de uma oportunidade para a operadora de telecomunicações pensar em prover não apenas transmissão de dados, mas também passar a ofertar produtos complementares, podendo realizar assim uma integração vertical.
Embora haja uma grande centralidade em torno da transmissão de dados, o que vem hoje mantendo e gerando receitas para os operadores em função do declínio das receitas geradas pelos serviços de voz, SMS e roaming – em breve vivenciaremos o mesmo efeito que ocorreu no mercado de energia elétrica, que viu o seu principal produto se torna cada vez mais uma commodity. Nesse sentido, isso deveria representar uma preocupação para operadores de telecomunicações.
Uma coisa é certa: o serviço de dados continuará a ser cada vez mais baratos, viabilizando assim a conectividade. Se as empresas de telecomunicações não quiserem ser apenas um ator coadjuvante da Quarta Revolução Industrial, como as de eletricidade foram no passado, deverão liderar essa mudança, trazendo para si um uma centralidade na cadeia. E, só existe uma forma de fazê-lo que é colocando o cliente no centro de tudo.
Pensar e agir com a obsessão no cliente exige que as operadoras foquem cada vez mais na digitalização de serviços, visando maximizar a experiência do consumidor, tratando-o assim como um diferencial, e também buscar prover a essa experiência através dos diversos canais e pontos de contato, a longa busca pelo almejado omnichannel.
Vale lembrar que os consumidores, de fato, não se preocupam com a complexidade da entrega dos serviços e não se importam em saber quem entrega o que ou que parte do serviço. Na verdade, eles se preocupam em ter uma experiência integrada com um provedor que não só fornece a conectividade, mas também, produtos personalizados, de acordo com seu histórico de compra, utilização, e, a convergência e integração de um ou mais serviços.
Na nova cadeia de valor, as operadoras de telecomunicações não deveriam focar apenas, como outrora, na retenção dos clientes e na redução do churn (taxa de evasão ou rotação de clientes). Elas devem garantir um papel relevante nesse processo, construindo um relacionamento diferente do que existe hoje com oconsumidor, focando na oferta de serviços digitais personalizados.
Eduardo Santini é diretor de Tecnologia, Mídia e Telecomunicação da KPMG