Por Julianna Rojas, Business Vice President da GFT Technologies no Brasil
A Inteligência Artificial (IA) tornou-se uma necessidade ao invés de uma simples tendência no mundo global dos negócios. Na esfera da administração pública, o caráter revolucionário que essa tecnologia pode proporcionar também não passou desapercebido. Em um setor em especial, a IA pode impactar de modo bilionário e em favor do cidadão: o ambiente das licitações e contratos governamentais.
Esta foi uma constatação importante que pude perceber durante a Expojud 2024, maior congresso de tecnologia, inovação e direito para o ecossistema de Justiça do Brasil, realizada há algumas semanas em Brasília (DF). O interesse em torno do uso da IA em licitações é grande, e existe muito para justificar essa demanda em expansão. A começar pela oportunidade de contratações mais eficientes, transparentes e justas. Mas não é só isso.
Ao adotar a IA, as companhias podem aumentar suas chances de sucesso em licitações, ao passo que as instituições públicas podem garantir a melhor utilização dos recursos públicos. E tudo isso graças a um conjunto de ferramentas poderosas que auxiliam no aumento da transparência e a competitividade em processos licitatórios. Um dos grandes benefícios é, por exemplo, analisar grandes volumes de dados e identificar padrões, combatendo assim a formação de cartéis.
No cenário brasileiro, essa eficiência administrativa embarcada em IA já possui exemplos práticos bastante positivos. No início deste semestre, a Controladoria-Geral da União (CGU) informou uma economia de R$ 11 bilhões em gastos públicos no país em licitações suspeitas, que foram suspensas ou canceladas após indícios de irregularidades. O resultado só foi possível graças ao uso de uma ferramenta de IA desenvolvida pelo órgão, a Alice (Analisador de Licitações, Contratos e Editais).
De acordo com a CGU, essa solução tecnológica usa técnicas de mineração de textos e IA que permitem escolher automaticamente editais para comunicar a gestão quanto a riscos na contratação. Isso ajuda a impedir o desperdício de recursos mediante cancelamento ou suspensões de pregões desnecessários, com indícios de fraudes e, em outros casos, por meio de ajustes nos valores e quantidades estimadas.
Na prática, a IA pode também dar mais agilidade a todos os aspectos que envolvem uma licitação, como por exemplo a criação de chatbots e assistentes virtuais que possam atender aos participantes, tirar dúvidas e fornecer informações de maneira rápida. Um exemplo disso é o ChatTCU, criado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e que já atende mais de 1.400 usuários da Corte, auxiliando em tarefas como análise de documentos, pesquisa jurídica, tradução e consultas administrativas.
A eficiência operacional, como se vê, possui amplo campo de progresso com o auxílio da IA no setor administrativo. Em licitações, ganhos comuns a outros setores econômicos do país também são verificados, como a automatização de tarefas repetitivas para liberar profissionais para ações estratégicas, as análises preditivas e em tempo real de grandes volumes de dados para identificar oportunidades e riscos, ou ainda o desenvolvimento de uma IA capaz de processar e entender a linguagem natural, facilitando a busca por informações relevantes em documentos e a interação com os sistemas.
Entretanto, é nas áreas de segurança e competitividade que a IA pode impactar de maneira mais decisiva quanto ao interesse público. Essa tecnologia pode identificar padrões de fraude e irregularidades em dados, como preços exorbitantes, propostas idênticas, empresas com histórico de problemas e documentos falsificados, e tudo isso protegendo os dados sensíveis utilizados nos processos de licitação, garantindo a privacidade e a segurança das informações. Essa mesma análise verifica a conformidade das propostas com as normas e requisitos legais, reduzindo o risco de erros e irregularidades.
Com classificações automáticas e personalizadas das propostas, a IA permite maior agilidade nos processos de avaliação, reduzindo os riscos humanos e identificando as melhores práticas do mercado, o que leva os interessados em cada processo licitatório a oferecer propostas mais competitivas – estas, por sua vez, que contemplem menos gastos e a possibilidade de maior margem de lucro. Em um futuro não muito distante, essa contribuição da IA terá forte impacto nos chamados contratos inteligentes, baseados em blockchain, mais eficientes e transparentes.
É importante não perder de vista, porém, que nada disso pode ser alcançado sem a condução responsável daquela que é sempre a protagonista por trás da IA: a mente humana. A tecnologia, quando bem utilizada, é um componente de uma ampla equação que auxilia nas tomadas de decisão, mas quem dá a palavra – no caso da administração pública – é o gestor ou servidor público. E até mesmo as auditorias, se forem necessárias, são facilitadas pela IA, que cria um registro completo e detalhado de todas as etapas do processo licitatório, desde a abertura do edital até a homologação do resultado.
A evolução dos modelos de contratações públicas no Brasil vive uma nova realidade desde 2021, com a lei 14.133, que visa aprimorar a governança e o uso de dinheiro público no país. Aos administradores que queiram tirar proveito dela em benefício da sociedade, a IA se coloca como um potencial fio condutor de eficiência, transparência e novas inovações no curto, médio e longo prazo.
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