Abrir o capital é uma das opções que as organizações têm para diversificar a captação de recursos. No entanto, a jornada até uma oferta inicial de ações (IPO, da sigla em inglês Initial Public Offering) é longa, conta com diversas implicações e requer maturidade institucional e grande mudança na cultura organizacional das empresas. Para auxiliar as companhias nessa preparação, a Deloitte, maior organização de serviços profissionais do mundo, em parceria com a B3, lança o estudo “Preparação e custos para abertura de capital no Brasil – Uma análise sobre as ofertas de ações no País entre 2004 e 2020”. O levantamento tem como base dados públicos disponíveis nos prospectos definitivos de ofertas públicas realizadas no Brasil, de janeiro de 2004 a maio de 2020, sendo ofertas iniciais (IPOs) ou subsequentes (follow‑ons), realizados pela Instrução CVM 400, além de informações referentes às ofertas subsequentes com esforços restritos pela Instrução 476, fornecidas pela B3.
De acordo com o levantamento, a média do percentual dos custos com ofertas públicas em relação ao valor distribuído é de 4,9% para IPOs, de 3,4% para follow-ons e de 3,5% para follow-ons realizados pela Instrução CVM 476. As comissões de colocação, coordenação, garantia de liquidação e incentivo, entre outras, compõem a maior parte dos custos para a abertura de capital. Já as despesas com auditores, advogados e publicidade, entre outras, são em menor proporção no montante dos custos. Cerca de 80% dos gastos de uma empresa no processo de IPO são com custos relacionados a comissões e 20% com as outras despesas. No caso dos follow-ons a proporção fica de 82% para comissões e 18% em despesas.
“O mercado de capitais no Brasil está passando por uma fase de reaquecimento. Mesmo com a pandemia de Covid-19, um momento desafiador da economia no mundo todo, foram realizadas, em 2020 no Brasil, 26 ofertas públicas de ações, entre IPOs e follow-nos; além disso, mais de 50 IPOs estão atualmente protocolados junto à Comissão de Valores Mobiliários e em processo de análise pelo regulador. Se todos os IPOs que estão para acontecer de fato forem realizados, 2020 poderá ter um recorde. E as companhias que tiverem investido em uma preparação de longo prazo serão as menos impactadas pelos custos relativos à abertura de capital”, diz Carlos Zanotta, sócio de Global Capital Markets Group da Deloitte.
O estudo mostra, ainda, que as empresas que fazem a sua oferta inicial em segmentos mais elevados de governança corporativa e que, portanto, criam uma estrutura de transparência, controles e governança, possuem impacto positivo na atratividade de investidores, na valorização do negócio e na imagem da empresa.
“Com as perspectivas de manutenção de juros baixos e o processo de migração de investimentos para o mercado de capitais e para a bolsa, cria-se um ecossistema favorável para novas ofertas. Em se mantendo esse cenário, a expectativa é que veremos cada vez mais companhias abrindo capital na bolsa e utilizando instrumentos disponíveis no mercado de capitais. A B3 está firmemente empenhada em incentivar essa agenda transformacional do mercado de capitais brasileiro”, diz Rogério Santana, Diretor de Relacionamento com Empresas e Assets da B3. “Como exemplo desse esforço, vale mencionar a possibilidade de prorrogação do prazo das taxas de análise pagas pelos emissores para realizarem suas ofertas. Em razão da pandemia, a empresas ofertantes de valores mobiliários que efetuaram o pagamento das Taxas de Análise até 31/03/2020 e, por conta das condições de mercado, decidiram adiar o processo de listagem ou de distribuição estarão isentas da cobrança de novas Taxas de Análise caso protocolem novos pedidos de análise até 31/03/2021”, completa.
Composição dos custos para abertura de capital
Os custos relativos à preparação de uma empresa para a abertura de capital dependem, essencialmente, da estrutura que a companhia já possui. Por isso, é possível concluir que as organizações que já tenham investido em uma preparação de longo prazo serão menos impactadas por esses gastos. Os custos envolvidos são divididos entre componentes diretos e indiretos. Como diretos estão alocadas todas as despesas com coordenadores, advogados, auditores, taxas pagas às bolsas de valores, à publicidade legal e à imprensa e à adoção de regras de governança corporativa.
As despesas com os coordenadores – instituições financeiras autorizadas a atuar no sistema de distribuição de valores mobiliários – são geralmente os custos individuais mais altos da abertura de capital. Nos IPOs e em follow-ons brasileiros, as despesas com os coordenadores são: comissão de colocação, comissão de coordenação, comissão de garantia de liquidação e incentivos. As comissões representam a remuneração paga aos coordenadores por sua prestação de serviços e geralmente são um percentual sobre o valor total de distribuição da oferta.
Entre 2004 e maio de 2020 o custo médio com as comissões foram de 3,8% sobre o valor distribuído no caso dos IPOs; 2,7% nos processos de follow-on; e 2,5% nos Follow-ons de acordo com a instrução CVM 476. O percentual gasto em comissões varia de acordo com as condições do mercado, com o tamanho e complexidade da operação e do regime de colocação – com garantia firme, que é quando os coordenadores se comprometem a adquirir todo o lote de títulos mobiliários a ser ofertado na transação, ou melhores esforços, quando o coordenador assume a função de fazer o melhor esforço possível para encontrar interessados nos títulos, na busca por transmiti-los.
As despesas existentes na abertura de capital são relacionadas aos assessores jurídicos, que auxiliam a companhia nas questões societárias antes da oferta e nos preparativos ao longo da transação. O relatório da Deloitte mostra que o custo médio com honorários de advogados nos últimos 16 anos foi de 0,41% sobre o valor distribuído nos IPOs, 0,20% nos Follow-ons e 0,33% nos Follow-ons CVM 476. Já a média de despesas com auditores independentes, que auditam os relatórios e demonstrações financeiras, foi de 0,14% (IPO), 0,07% (Follow-on) e 0,19% (Follow-on 476).
Relação entre custos e tipos de listagem
Ao compreender a necessidade de cada componente na abertura de capital, é possível entender quanto cada um deles representará de custos durante e após a oferta de ações. A média dos custos relacionados com IPOs sobre os valores distribuídos ficou em 4,9% para o período entre 2004 e 2020. Separando as comissões dos bancos e as despesas da oferta, as médias ficaram 3,9% para as comissões e 1% para as despesas.
A média dos custos com follow-on ficou em 3,4% sobre o total dos valores distribuídos. Desse percentual, 2,8% são relacionados às comissões e 0,6% referentes às despesas. Ofertas subsequentes, usualmente, envolvem custos menores pelo fato de a companhia já ser pública e de os custos estarem relacionados à atualização de documentos que a companhia já periodicamente divulga ao mercado.
A média dos custos relacionados a ofertas através da CVM 476 ficou em 3,5%, sendo 2,5% relacionado às comissões e 1,0% às despesas sobre os valores distribuídos. Os follow-ons de acordo com a Instrução CVM 476, que são restritos a investidores profissionais, começaram no mercado brasileiro a partir de 2015. Nessa modalidade não há despesas com publicidade e nem com taxa de registro – logo, ela tende a ter um custo menor do que o das ofertas públicas.
Cada setor de atuação apresenta uma característica e um comportamento diferente. Essas diferenças devem ser levadas em consideração quando se realiza o levantamento dos custos para abertura de capital. Certos setores, devido a sua complexidade, inclusive de suas estruturas societárias, envolvem maiores riscos, requerem divulgações adicionais e maior nível de envolvimento de bancos, auditores e advogados, aumentando o valor das comissões e despesas.
Entre 2004 e maio de 2020, as indústrias cujos custos médios com ofertas públicas foram mais altos são: agronegócio (5,7% sobre o valor distribuído), têxtil e calçados (5,7%), prestação de serviços (5,4%), educacional (5,1%) e informática, TI, internet e eletrônicos (5,1%).
Custos para abertura são menores nas ofertas com maior valor distribuído
O levantamento mostra, ainda, que quanto mais a companhia capta na abertura, menor é seu custo. Desde 2004, o custo médio com ofertas públicas foi de 6,4% no caso de IPOs de empresas que captaram até R$ 200 milhões, 5,4% para companhias que levantaram entre R$ 201 milhões e R$ 500 milhões, 4,7% entre R$ 501 milhões e R$1 bilhão. As organizações que captaram entre R$ 1 bilhão e R$ 10 bilhões, o custo médio foi de 4,2%.
Já no caso dos follow-ons os percentuais foram: 4,1% (até R$ 200 milhões), 4,2% (entre R$ 201 milhões e R$ 500 milhões, 3,8% (R$ 501 milhões a R$ 1 bilhão) e 3,1% (entre R$ 1 bilhão e R$ 10 bilhões).
Governança corporativa valoriza rentabilidade das companhias
Com o IPO, a empresa deve elevar suas práticas de governança corporativa a um padrão altamente diferenciado. Esse padrão de governança e controles internos exigido de uma companhia aberta influencia positivamente na valorização da empresa e na sua operação. Além dos aspectos regulatórios, a preparação das empresas permite uma avaliação antecipada de seu grau de governança e transparência, frente ao requerido pelos segmentos de listagem da B3. O estudo da Deloitte e B3 mostra que desde 2004 as empresas que operam em padrões mais elevados de governança têm uma rentabilidade muito mais expressiva do que as demais.
Os segmentos de listagem da B3 – Bovespa Mais, Bovespa Mais Nível 2, Novo Mercado, Nível 2 e Nível 1 – foram criados para desenvolver o mercado de capitais brasileiro a terem regras de governança corporativa mais avançadas.
O estudo “Preparação e custos para abertura de capital no Brasil” aponta que, de 2004 a maio de 2020, a maioria dos IPOs (135), dos follow-ons (78) e follow-ons CVM 476 realizados no País foi listada no Novo Mercado. Todas as ofertas iniciais de ações registradas pela pesquisa referentes de 2020, por exemplo, foram listadas nesse segmento.
Metodologia do estudo
O estudo “Preparação e custos para abertura de capital no Brasil – Uma análise sobre as ofertas de ações no País entre 2004 e 2020” foi desenvolvido com base em dados públicos disponíveis nos prospectos definitivos de ofertas públicas realizadas no Brasil, de janeiro de 2004 a maio de 2020, sendo ofertas iniciais (IPOs) ou subsequentes (follow‑ons), realizados pela Instrução CVM 400, além de informações referentes às ofertas subsequentes com esforços restritos pela Instrução 476, fornecidas pela B3.
A população do levantamento foi composta inicialmente por 174 ofertas iniciais e 128 ofertas subsequentes realizadas conforme a Instrução Normativa CVM 400 e por 62 ofertas subsequentes com esforços restritos, totalizando 364 ofertas. Contudo, em virtude das características e dos altos valores na distribuição, foram excluídas da população inicial, com o intuito de manter a homogeneidade da amostra analisada, sete transações com valores distribuídos superiores a R$ 10 bilhões, todas realizadas de acordo com a Instrução CVM 400.