Design Thinking: a estratégia do iPhone 6

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Por Marcos Morita*

Apesar dos céticos e críticos de plantão, os quais colocaram em dúvida a sobrevivência a longo prazo da Apple sem a ira e a genialidade de seu fundador e CEO, Steve Jobs, a companhia de Cupertino continua a encantar consumidores de todo mundo, fato comprovado na semana passada com o lançamento do IPhone em sua versão de número 6. Consumidores ávidos enfrentaram horas de espera em várias partes do mundo para ter em mãos o objeto de desejo. Algo raro, considerando um produto maduro.

Acredito que um dos principais pilares que levou e levará a marca adiante é sua preocupação extrema com o design, o que compreende não apenas a aparência, mas a tríade: usabilidade, retorno financeiro e viabilidade tecnológica, variáveis que compõem a metodologia conhecida como Design Thinking, cujo expoente máximo é Tim Brown, amigo de Jobs desde os tempos de universidade e fundador da IDEO, empresa de design que tem auxiliado empresas em todo o mundo a implantar o conceito.

A metodologia é composta de seis passos: compreender, observar, sintetizar, prototipar, iterar e implementar. Vejamos o caso da fabricante de peças para bicicletas Shimano, a qual contratou a IDEO para encontrar formas de expandir suas receitas no segmento de alta performance. Durante as discussões iniciais, os consultores da IDEO decidiram ir além, pesquisando a grande massa não adepta aos ciclismo, ampliando o escopo da primeira fase: compreensão1 ou definição do problema.

Saíram a campo, observando, conversando e descobrindo fatos inusitados. A maioria, por exemplo, associava o hábito a lembranças positivas do passado. Hoje fora de forma, sentiam-se intimidados por vendedores sarados em suas calças de lycra, discursando sobre os novos materiais e tecnologias. Outros por sua vez tinham uma na garagem com pneus murchos, correntes ou cabos soltos. Finalmente, a dificuldade em encontrar locais seguros para pedalar completavam o ciclo de desmotivação.

Coletadas as informações, especialistas de diversas áreas e com formações distintas: psicólogos, engenheiros, designers, sociólogos e administradores, trabalharam de maneira colaborativa na sintetização das informações, listando os principais problemas encontrados e partindo para uma solução completa e ampla, colocando a experiência do usuário no centro de suas preocupações através de uma abordagem holística, possível graças a diversidade de opiniões e experiências do grupo.

O próximo passo foi a prototipação, criando um modelo de bicicleta que fosse ao mesmo tempo tecnologicamente avançado e de fácil manutenção. O protótipo desenvolvido tinha guidom alto, selim confortável, um certo ar retrô, frenagem acionada pedalando-se ao contrário e pasmem, nenhum cabo. As marchas eram trocadas a medida em que o ciclista aumentava ou diminuía a velocidade. Simples, elegante e fácil de manusear e manter.

Uma vez pronto o protótipo era hora de iterar ou apresentá-lo aos potenciais consumidores, cuja opinião e sugestões eram levadas novamente ao grupo, os quais as analisavam e propunham novas soluções, refinando o produto final. Vale salientar que esta técnica é também utilizada no método conhecido como Lean Startup ou Startup Enxuta, criado por Eric Ries, sendo denominada como MVP ou Produto Mínimo Viável, cujo objetivo é diminuir os riscos no lançamento de produtos.

Por fim, a IDEO avaliou os demais pontos levantados pelos usuários criando uma solução holística, desenvolvendo um conceito denominado COASTER, o qual abrangia muito mais que uma simples bicicleta, mais um modo de viver a vida. Lojas foram remodeladas, vendedores treinados e locais para práticas de ciclismo seguro divulgadas em várias cidades, completando a implementação do projeto, cujo sucesso pode ser mensurado pelo número de fabricantes que abraçaram a causa.

Apesar da dificuldade em comparar bicicletas e celulares, qualquer semelhança não é mera coincidência. Permanecer horas em uma fila cercado por fanáticos e saber que felizmente nada mudará na elegância, no toque e na interação fácil e intuitiva, faz com que os usuários sintam-se confortáveis e familiares, razões que podem explicar tamanha lealdade, consequência da aplicação do Design Thinking, não obstante a falta que sentimos da calça jeans surrada, camiseta preta e tênis New Balance.

Marcos Morita é mestre em administração de empresas e professor da FIA-USP e Universidade Mackenzie. Especialistas em estratégias empresariais, é palestrante e colunista. Há vinte anos atua como executivo em empresas multinacionais.