Cartão de crédito – será que o brasileiro sabe usar?

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Por Reinaldo Domingos

Uma recente pesquisa do Datafolha, encomendada pela Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs), coloca em foco o uso consciente de cartões de crédito, apontando dados positivos, dentre os quais se destaca o fato de que 85% dos entrevistados haviam quitado 100% de sua última fatura. À primeira vista, esta parece uma boa notícia, contudo, será que condiz totalmente com a realidade?

O que observo frequentemente é que as pesquisas, da forma como são apresentadas, nem sempre relatam o verdadeiro problema. Assim, vejamos: os dados são positivos, já que, além do acima apresentado, temos também que 69% dos entrevistados utilizam parcelamentos do cartão sem juros, o que também aparenta ser interessante. Mas, se formos analisar a fundo, veremos que nas pesquisas apresentadas não são consideradas as armadilhas do crédito e essas, para quem não tem educação financeira, são bombásticas, para não dizer covardes.

Isso porque esses consumidores não percebem que utilizar o cartão de crédito para pagamentos e compras também é uma forma de endividamento, que tem prazo médio de trinta dias. Isto é, com a falta da capacidade de compra à vista, esses consumidores utilizam dessas ferramentas, e o mais incrível é que observo frequentemente casos que já incluem o limite do cartão no orçamento mensal.

Muitos devem questionar: “mas, se a pessoa cumpre com esse compromisso, não haverá problemas”. Isso é uma ilusão, já que o consumidor estará sempre andando na “linha da navalha” e, caso ocorra qualquer imprevisto financeiro, estará exposto aos pesados juros dessa linha de crédito. E isso não ocorre só com o crédito, também observo isso na utilização de cartões de débito, pois há pessoas que utilizam a linha, chamada de limite do cheque especial, que também traz uma taxa de juros média de 8% ao mês.

Outro ponto da pesquisa que devemos olhar com preocupação é o fato já citado de que quase dois terços do total das compras do mês serem realizados por meio de parcelamentos futuros, sem juros. Neste ponto, vemos uma armadilha fantasiada de benefício, sendo que não há a percepção que aí existe uma tomada facilitada de crédito, assim, parcela-se quase tudo que se compra e, se não houver controle, no máximo em seis meses, esse consumidor comprometerá grande parte do ganho mensal somente com as prestações somadas.

Não quero parecer pessimista, mas é mais comum do que se imagina encontrar pessoas que começaram a se descontrolar financeiramente e chegam ao endividamento crônico, por meio da utilização desses chamados “benefícios”.

Mas o que realmente me preocupou nessa pesquisa e que não se dá a devida importância é o fato de que existem 12% dos entrevistados que não quitam a fatura, pagando ou a parcela mínima ou outros percentuais. Esse dado é assustador e sinaliza um grave problema na vida financeira desses consumidores.

Quero deixar claro que de modo algum quero fazer campanha contra essa importante ferramenta de consumo. Sempre afirmo que ela é fundamental para os consumidores e para o mercado e que, se bem utilizadas, trazem uma série de benefícios. Eu mesmo utilizo com frequência, tendo diversos benefícios, como é o caso de milhagem. O que me preocupa mesmo é a utilização sem educação financeira.

Por isso, alfabetizar financeiramente o consumidor brasileiro passa a ser determinante para o futuro de nosso país, caso contrário, teremos uma população endividada de forma não sustentável, o que pode levar até mesmo à falência. O que me preocupa é que, por não utilizarmos corretamente essa e outras ferramentas que nos disponibilizam, estamos no caminho de uma bolha do crédito, em que os consumidores não conseguirão honrar seus compromissos assumidos. Ou a população se atenta rapidamente a esse fato ou será tarde demais para mudar essa situação.

Para concluir, veja algumas orientações que elaborei para o uso consciente do cartão de crédito:

1. Se tiver apenas um ganho mensal, tenha apenas um cartão de crédito; caso ganhe semanalmente, pode ter até três cartões, com vencimento para os dias 10, 20 e 30. Com isso, poderá comprar até cinco dias antes de seu vencimento, ganhando 35 dias para pagar;

2. O limite do cartão de crédito deverá ser, no máximo, de 50% do salário ou do ganho mensal, o que evitará gastar mais do que se recebe;

3. Cuidado ao fazer parcelas fixas, é preciso saber que, quando se parcela, compromete os meses futuros do orçamento mensal;

4. Nunca pague a parcela mínima, caso tenha um desequilíbrio financeiro, procure outra linha de crédito que não ultrapasse 3% ao mês;

5. Caso tenha se descontrolado financeiramente, é preciso fazer imediatamente um diagnóstico financeiro e descobrir o verdadeiro problema. Geralmente, vamos parcelando e, quando acordamos, estamos totalmente tomados pelo crédito;

6. É preciso ter consciência na hora de consumir. Sempre pergunte se realmente precisa disso, se tem dinheiro para comprar e se tem como pagar a fatura total do cartão no seu vencimento;

7. É importante negociar e, se possível, pedir isenção da taxa de anuidade do cartão de crédito. Hoje, é possível encontrar cartões que não cobram nenhuma taxa de manutenção;

8. Busque pelos benefícios que o cartão de crédito pode oferecer, sejam prêmios ou milhagens.

Reinaldo Domingos é educador e terapeuta financeiro, presidente da DSOP Educação Financeira, Abefin e Editora DSOP, autor do best-seller Terapia Financeira, dos lançamentos Papo Empreendedor e Sabedoria Financeira, entre outras obras.