Carta aberta de um investidor para Michel Temer

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* Por Allan Pires

“Verba volant, scripta manent”. Presidente Michel Temer, se eu pudesse escrever uma carta diretamente a você pediria a sua ação direta para o reajuste e gestão efetiva das contas públicas. Naturalmente, uma proposta séria de ajuste das contas traria confiança ao mercado internacional para a realização de investimentos produtivos ou financiamentos de longo prazo. Sei que os desafios a serem enfrentados são muitos, mas como creio que com uma economia pulsante tudo fica mais fácil, um não aumento da carga tributária promoveria um ambiente receptivo para investimento.

Na física e na administração há o ditado: “o que não se mede, não se gerencia”. Um ajuste de contas mediaria os custos e despesas da chamada administração direta – fortemente representada pelo inchaço do funcionalismo público, responsável por comer mais de 80% das nossas contas públicas. Isso também é causado pelo descontrole da previdência social e das despesas financeiras relacionadas aos empréstimos feitos pelo governo com fins de custeio ou investimentos.

O governo tem de pagar juros de empréstimos que ele mesmo já realizou. E o que sobra? É o que chamamos de capacidade de investimento da máquina pública, ou seja, o dinheiro que se pode investir – indicador importante para se acompanhar. E, como sabemos, o crescimento em qualquer País se dá por duas maneiras: através de investimento ou de crédito.

Nos anos de prosperidade do governo Lula, a população acelerou o consumo de bens e o carro é um exemplo deste período. As ações do governo geraram uma tomada desenfreada de empréstimos pelos brasileiros. Ficou fácil financiar. Fácil demais. Com o slogan “pague em 60-80x”, a população não estava mais interessada no valor total do veículo, mas quanto elas iriam pagar por mês. Hoje, vemos que esse modelo não é sustentável. Por sinal, um comportamento idêntico ao adotado pelos dois últimos governos.

O modelo sustentável de crescimento em qualquer País, então, depende única e exclusivamente de investimento. E esse investimento é feito por quem? Pelo governo ou pela iniciativa privada. Como há baixo investimento ou captação de novos recursos, a segunda opção é a que melhor se encaixa. Contudo, as altas taxas de juros inibem esse movimento. Adicionalmente, o mercado está sem confiança. Então, para qualquer um investir é preciso saber se o público-alvo está disposto a comprar e qual o potencial deste mercado. No momento, nenhum dos dois se apresenta claramente em um cenário de curto prazo.

Sei que nesta viagem à China – sua primeira missão oficial como líder do País – o desafio maior foi atrair mais investimentos a partir de encontros bilaterais com empresários e governos. Entretanto, qual será a base de confiança a ser utilizada para que essas organizações globais voltem a olhar para o Brasil? Há uma necessidade urgente de redesenhar o sistema econômico brasileiro. Precisamos de um choque de gestão.

Pense comigo. Historicamente, muitos países aumentam a taxa de juros quando a inflação está alta como forma de desincentivo ao consumo. Então, por que a taxa de juros brasileira é sempre alta? Não importa se estamos crescendo ou em crise, o cenário é sempre o mesmo. Nossa taxa básica SELIC está em 14,25% enquanto que nos Estados Unidos e na Inglaterra sua correspondente está em 0,5%.

Isso é duro de explicar para as pessoas. Qualquer especialista pode confirmar que o governo anterior não geriu as contas públicas da maneira certa. Gastou-se mais do que se poderia, comprometendo o futuro do País. Segundo o Tesouro Nacional, os nossos endividamentos internos e externos já somam R$ 2,87 trilhões, ou seja, a capacidade de investimento do governo hoje é limitada.

Sinceramente, não queria estar na sua pele. O cenário, como vimos, é extremamente adverso. Porém, como investidor, faço uma analogia que representa o sentimento da nossa classe. Quem passa por uma dieta alimentar para perder peso sabe que, antes de emagrecer, é preciso parar de engordar. Hoje o Brasil parou de engordar. Agora é preciso adotar as medidas necessárias para emagrecer. Ou seja, ter mais agilidade para produzir riquezas e um bem-estar melhor para toda a sociedade.

Mediante a situação de caixa do governo, a única forma de acelerar a economia é por meio da iniciativa privada. A demanda por investimentos em infraestrutura como a criação de novas rodovias ou portos impacta diretamente na economia. O Brasil necessita de investimentos contínuos do setor privado e as concessões se tornam fundamentais na área de infraestrutura. No setor de agronegócio, por exemplo, os portos brasileiros são ineficientes pelas longas filas. O trajeto é sempre sofrido, pois você também utiliza a estrutura rodoviário-metroviária e os atrasos no desembarque das matérias-primas podem acarretar altos prejuízos, pois existem produtos que dependem do tempo.

Analisando este cenário, poderíamos ser muito mais competitivos se tivéssemos melhor infraestrutura. Não podemos contar somente com a desvalorização do Real, devemos ser bons competidores em qualquer moeda. Há investidores de olho no sistema portuário brasileiro e com intenção de expandir o seu portfólio em outras áreas. Contudo, a não clareza no processo de concessões ou permissão de novos investimentos neste setor afasta a participação do setor privado e a nossa ineficiência continua crescendo.

Quando melhoramos a infraestrutura, e o custo Brasil, a tendência é que os negócios decolem. Para que isso aconteça, peço para que nos dê mais condições. Veja, não estou falando em dinheiro. O seu papel como líder é gerir de forma efetiva as contas públicas de maneira que sobre caixa para o governo realizar investimentos. Em relação à percepção de risco-Brasil, esperamos uma melhora na taxa de juros. Sentir-me-ei mais estimulado para investir se o governo me conceder espaço para impulsionar áreas que o País tanto carece. Com isso, sobra mais tempo para o governo focar no que é básico e de direito do brasileiro como saúde, educação e moradia.

Allan Pires, CEO para a América Latina e Texas da multinacional dinamarquesa Targit