A queda pela metade nos investimentos em startups em 2022, apontada pela plataforma de inovação Distrito, confirmou o que vinha sendo apontado como desaceleração no ecossistema. Contudo, na visão de integrantes do BR Angels, um dos primeiros grupos de investidores-anjo criado fora do ambiente acadêmico no país, a baixa nos aportes trouxe um amadurecimento para o segmento. Sendo assim, a estimativa é que as negociações de 2023 sejam mais assertivas, com a associação destinando até R$ 20 milhões para startups mais resilientes e com resultados realmente sustentáveis.
“Estamos mais racionais, buscando valuations mais maduros e startups que consigam provar que os resultados que almejam e prometem estão embasados em algo maior. Agora, fundos de Venture Capital, anjos e todo ecossistema estão avaliando não somente o crescimento, mas também o breakeven dos negócios no médio e no longo prazo. Capacidade de execução nunca foi tão importante”, declara o fundador e CEO da associação de investimento-anjo BR Angels, Orlando Cintra.
“Outro fator que deve ser levado em conta é que, comparado com o recorde nas captações pelas startups em 2021, já era esperado algo diferente em 2022, até para que o mercado pudesse trazer mais equilíbrio para os investimentos. Isso, somado à alta de taxas de juros no mundo, trouxe um novo panorama, mas que de forma alguma demonstra uma crise direta no setor. O mercado de VC continua forte”, acrescenta Cintra.
O que sustenta o otimismo é o ritmo de investidas do próprio BR Angels, que foi um dos players que tiveram protagonismo no setor no último ano – apenas em 2022, participou de 11 aportes. Desde sua fundação, em 2019, o grupo foi responsável por 26 investimentos e tem negócios de sucesso em seu portfólio, como a Chiligum, que fez um exit positivo em apenas um ano e meio, além de CustomerX, Dialog, Incentiv.me, LandApp, Nvoip e Sirros IoT – todas integrantes do ranking 100 Open Startups 2022, que destaca as startups mais atraentes para o mercado corporativo. Para 2023, a expectativa é chegar a 40 negócios no portfólio.
Hoje, são mais de 260 altos executivos de importantes empresas que integram o BR Angels, número que deve ultrapassar 350 até o final do ano. No entanto, mais do que investir em busca de rentabilidade, o que estes profissionais buscam é trocar com o ecossistema de inovação, entregando conhecimento através de smart capital e, ao mesmo tempo, aprendendo com negócios altamente conectados com o futuro e as tendências condutoras da transformação digital.
“O BR Angels não é um fundo, é um grupo de investimento-anjo. Fazemos uma seleção rigorosa de pessoas que podem adicionar capital intelectual para as investidas e, atualmente, só aceitamos associados por indicação. No que diz respeito às startups, também prezamos muito mais pela qualidade do que pela quantidade. Por isso, realizamos uma seleção muito intensa pelos negócios que se encaixam com a nossa tese, que são, primordialmente, aqueles em que podemos adicionar valor com nosso smart money, abrir portas e apoiar em muitos outros aspectos”, explica Orlando Cintra.
“Para nós, o mais importante é que fazemos tudo isso recebendo a nota 4,8 de 5 no quesito mentoria e abertura de portas, em pesquisa realizada duas vezes ao ano com nossas startups. Essa espécie de NPS para o portfólio é um dos nossos indicadores de sucesso, que ainda contam com um exit e taxa zero de write off”, continua Cintra.
A Diretora Sênior da Avalara e associada ao BR Angels, Tricia Braga, enxerga que o foco dos aportes em 2023 não deve ser em um setor de atividade específico, mas sim em temas que as startups já deveriam estar endereçando, como sustentabilidade, metaverso, inteligência artificial e big data.
“Na minha visão, qualquer setor que tenha uma destas premissas em seu plano de negócios terá grande chance de sucesso. A projeção para 2023 é extremamente positiva e continua em franco crescimento, tal qual experienciamos nos últimos 5 anos. O maior destaque para os anos vindouros é a implementação da rede 5G, que está alterando completamente a tecnologia e a forma como as empresas falam entre si e com seus consumidores”, comenta a executiva.
“Com a rede 5G, haverá uma capacidade de rede massiva e uma experiência de usuário mais uniforme. Essa melhoria do desempenho e da eficiência irá capacitar novas experiências de usuário e conectar novos setores de atividade. Portanto, há grandes passos a serem dados nos próximos anos, com profundas disrupções e oportunidades em todos os setores. Porém, é preciso ter cautela, já que a entrega de tecnologia não será mais suficiente para garantir o crescimento das startups. Antes de tudo, elas precisam estar atentas a todos aos movimentos do mercado que gerem valor agregado comprovado a seus clientes”, complementa Tricia Braga.
Da mesma forma, o sócio-proprietário da LGD Advogados e membro do BR Angels, Daniel Dirani, aponta que, mesmo com todo o desenvolvimento tecnológico, os aportes em startups em 2023 dependerão de uma boa estruturação dos próprios negócios para passarem pelas rodadas.
“Estruturar a empresa para receber um investimento vai além de um bom pitch. Essa estruturação precisa acontecer em vários níveis: fiscal, jurídico, societário, trabalhista, plano de crescimento, organização societária, além de ser crucial ter uma boa divisão de captable. Isso quer dizer que a startup precisa demonstrar claramente o caminho para crescimento, com lucro, capacidade de execução e maturidade”, analisa Dirani.
O líder do BR Angels ainda acrescenta que a prudência deve estar presente de ambos os lados. “A startup precisa buscar os melhores parceiros para uma maratona, não para uma corrida de 100 metros que explode com o aporte e logo depois deixa de ter ritmo. Já quem deseja investir em startups, precisa refletir se está fazendo pelos motivos certos, ou seja, para ter contato com o ecossistema, doar seu capital intelectual, ajudar e interagir com os negócios, muito além do aspecto financeiro. E nunca se deve começar sozinho”, diz.
“A chance de se apaixonar por um negócio errado e colocar algum dinheiro, seja ele qual for, é muito grande. Participar de grupos de investimento aumenta a probabilidade de acerto e eleva o aprendizado. Um investimento-anjo é um investimento de alto risco, então tentar minimizar esse risco é muito importante”, complementa Orlando Cintra.