No último dia 30 de dezembro, houve a sanção parcial e publicação da LC 157/2016 aprovada pelo Congresso Nacional e que amplia a lista de serviços passíveis de tributação pelo Imposto Sobre Serviços (ISS), de competência dos municípios e do Distrito Federal. Uma das novas possibilidades de tributação diz respeito aos “serviços” de streaming de filmes e música. Ocorre que, na avaliação do advogado Evandro Grili, sócio do escritório Brasil Salomão e Matthes Advocacia, essa cobrança pode ser inconstitucional, pois que as atividades realizadas pelas empresas de streaming não poderiam ser consideradas serviços.
A principal novidade nesta lei foi a inclusão do item 1.09 na Lista, que define um novo fato gerador do imposto municipal, qual seja: “Disponibilização, sem cessão definitiva, de conteúdos de áudio, vídeo, imagem e texto por meio da internet, respeitada a imunidade de livros, jornais e periódicos (exceto a distribuição de conteúdos pelas prestadoras de Serviço de Acesso Condicionado, de que trata a Lei no 12.485, de 12 de setembro de 2011, sujeita ao ICMS)”, o que dessa forma, impacta diretamente os serviços de streaming, como Spotify e Netflix.
A discussão que surge a partir dessa decisão é sobre a legitimidade da lei, uma vez que a disponibilização de mídia por streaming não se caracteriza como serviço, mas sim como cessão de uso.
Como se definem os serviços?
Os serviços, normalmente, são caracterizados pela prestação de obrigações de fazer. O indivíduo interessado em determinado tipo de prestação contrata os serviços de um determinado prestador, profissional ou empresa que, em regra, produz algo personalizado para o contratante, para atender suas necessidades particulares.
“Quando contratarmos a Netflix, por exemplo, estamos em busca de acesso aos filmes e séries que ela nos disponibiliza, mediante a mensalidade que nos cobra. A empresa adquire os direitos junto aos produtores destes filmes e séries, com a permissão de distribuí-los aos seus clientes para uso doméstico. Em síntese, quando contratamos esse acesso estamos adquirindo, por cessão não definitiva, direitos de acesso e uso doméstico dos filmes, vídeos, etc. É uma típica obrigação de disponibilizar esses conteúdos, uma obrigação de dar, nunca uma obrigação de fazer em caráter pessoal”, explica Evandro Grili.
Qual o objetivo do governo ao publicar a LC 157/2016?
O principal objetivo do governo com a lei é aumentar a arrecadação mirando em novos negócios que tem movimentado a economia. O texto afirma, ainda, que o ISS não poderá ser objeto de concessão de isenções ou benefícios de qualquer tipo para as empresas e considera ato de improbidade qualquer ação dos municípios nesse sentido.
Quando a lei passa a valer?
O princípio da anterioridade nonagesimal define que um novo tributo entra em vigor 90 dias depois da lei publicada. Contudo, como a LC 157/2016 não criou obrigação tributária para nenhum contribuinte, cada cidade que tiver interesse em exercer essa competência tributária deverá criar leis municipais instituindo o tributo, fixando alíquota, definindo fato gerador, estabelecendo os prazos e regimes de pagamentos. Após publicadas as leis municipais, o imposto passa a ser cobrado depois de noventa considerando a data de publicada a lei. Além disso, a lei municipal criadora do tributo terá que ser publicada no exercício anterior ao de sua vigência. Na prática, se um município legislar no começo deste ano, só em 2018 poderá começar a cobrar este tributo.
Por que a aplicação da lei é considerada ilegítima e o que acontece daqui para frente?
Com base no conceito de que não se tributam obrigações de dar pelo ISS, o Supremo Tribunal Federal editou, tempos atrás, a Súmula Vinculante nº 31, que vedou a incidência do ISS sobre a locação de bens móveis.
“Se mantivermos as mesmas premissas que levaram o Superior Tribunal Federal a considerar inconstitucional a cobrança de ISS pela locação de bens móveis, nos parece que também não devemos considerar que seja possível e constitucional cobrar ISS sobre as receitas das empresas de streaming de filmes, vídeos e músicas. Neste caso, estamos diante de uma cessão de direito de uso das obras cinematográficas e musicais, o que não se configuraria serviço passível da tributação do imposto municipal”, conclui Evandro Grili.