O que a empresa familiar deve considerar antes de partir para processos de fusão e aquisição? – Por Eduardo Valério

Processos de fusões, aquisições ou vendas são questões relativamente novas para as empresas familiares brasileiras. O próprio mercado nacional é submetido a estes movimentos, de maneira mais enfática, nos últimos dez anos. Frente a este cenário, identificamos vários fatores que “estimulam” o processo, como por exemplo: a necessidade de diminuir o nível de endividamento; a demanda por um crescimento mais acelerado da empresa; a falta de sucessão; dificuldades operacionais, entre outros.

Em 2017, o número de fusões e aquisições no Brasil cresceu 3,6%, movimentando cerca de R$ 138,4 bilhões em transações, de acordo com dados divulgados recentemente pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). Nas empresas familiares, ambos os processos têm sido verificados com bastante frequência e equivalência. Além da própria dinâmica dos setores empresariais, notamos que a maior incidência de fusões e aquisições acontece a partir das segundas e terceiras gerações de sucessores, nas quais há coincidências entre as dinâmicas de mercado e familiar. Além deste fator, é importante lembrar que aqueles relativos ao ambiente de negócio, de finanças e de produção também podem ser considerados influenciadores das operações de fusão, aquisição ou venda.

Mesmo não tendo uma estatística finalizada sobre estes movimentos, estimamos que dos mais de 100 projetos em que estive à frente pela GoNext, entre 15% e 25% das empresas familiares passaram por algum destes procedimentos. O que chama a atenção é que nos últimos cinco anos o número vem crescendo, seja nos movimentos de venda, de aquisição ou de fusão. Inclusive de companhias brasileiras que adquirem empresas fora do país.

E quais são as motivações que levam uma empresa familiar a optar por estas estratégias? São várias: falta de alternativa para um processo sucessório; busca por capital; diminuição de endividamento; substituição de dívida; entre outros. Por isso, recomendamos aos proprietários das empresas familiares que conheçam a fundo como funcionam as metodologias de fusões e aquisição, de forma que estas possibilidades sejam eventualmente incorporadas às suas estratégias empresariais, evitando desgastes desnecessários e garantindo que todos os envolvidos na tomada de decisão estejam cientes das vantagens e/ou desafios.

Na hora de determinar qual é o caminho a ser seguido, cabe ao Conselho de Administração avaliar todos os cenários possíveis para o crescimento saudável da empresa. E cabe ao Conselho de Sócios/Acionistas aprovar determinada alternativa. Uma vez definidas estas instâncias da governança, podem ser considerados como “sinais” para iniciar um processo destes: dificuldade de crescimento orgânico da organização; fadiga das estruturas de capital da empresa; obsolescência tecnológica; aceleração do crescimento; e oportunidade de consolidação de mercado. Normalmente, estes fatores aparecem nas revisões dos planejamentos estratégicos, documentos nos quais são avaliados os riscos, oportunidades e ameaças para o negócio.

Muitas vezes, nas operações de fusões e aquisições, há grande preocupação dos membros da família com o futuro dentro da empresa. O que costumamos orientar é que os familiares possam, primeiramente, preparar-se para serem bons “donos de empresa”, ou seja, entender qual é o papel de um sócio, como ele deve constituir a governança da empresa, e, em algumas situações, saberem como atuar como gestores. Quando há um processo de fusão, aquisição ou venda, dependendo do acordo de sócios a ser formatado, geralmente os familiares deixam a gestão e passam a compor o Conselho de Administração da nova empresa. Por isso, é imprescindível que tenham conhecimento do novo modelo de atuação que irão fazer parte após a finalização dessas operações.

Eduardo Valério é graduado em Administração de Empresas pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), especialista em Estratégia e Marketing pela Kellogg School of Management, especialista em Governança Corporativa para Empresas Familiares pela The Wharton School, Pennsylvania e especialista em Gestão pelo Insead. Eduardo é diretor-presidente da GoNext, especializada em gestão de negócios e implantação da governança corporativa em empresas familiares.

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Conciliar tarefas de trabalho com as relações sociais não é tarefa fácil. Ainda mais quando envolve membros da mesma família. Muitas empresas familiares, além de focar nas questões administrativas, precisam trabalhar de forma incisiva na resolução de conflitos, que muitas vezes se tornam recorrentes não só no processo sucessório, mas também no dia a dia de trabalho. Na pesquisa Next Gen- Grandes expectativas, realizada pela PricewaterhouseCoopers (PwC) com empresários de mais de 50 países, em 2016, 52% dos participantes do Brasil, pertencentes a novas gerações, demonstraram preocupação com a governança familiar.

De acordo com Eduardo Valério, diretor-presidente da GoNext Family Business, a preocupação é válida, uma vez que os relacionamentos pessoais e profissionais podem se misturar, causando prejuízos nos dois âmbitos. “Existem conflitos internos nas empresas familiares que, muitas vezes, envolvem os subsistemas familiar, societário e de gestão, comprometendo a visão estratégica do negócio e as tomadas de decisão em conjunto. Entretanto, esses conflitos podem ser detectados e evitados com bastante eficácia se realizado um bom trabalho de governança corporativa”, comenta Valério.

Nos mais de 100 projetos que já atendeu à frente da GoNext, o especialista participou da resolução de muitos conflitos familiares e, dentre os mais comuns, elenca: quando um herdeiro assume um cargo sem estar preparado para ele, afetando os negócios; quando lucro é dividido sem planejamento, muitas vezes tendo uma saída de caixa maior do que a entrada; e, ainda, quando a empresa opta por fornecedores que são parte da família, podendo acarretar no pagamento de valores acima dos praticados no mercado e, em alguns casos, numa entrega com menos rigor de qualidade no produto ou serviço fornecido.

Apesar de serem danosos para a saúde financeira e, dependendo da estrutura administrativa, até para o relacionamento entre membros da família, tais conflitos podem ser resolvidos com disposição e, principalmente, com o auxílio de alguns instrumentos de governança corporativa. O mais utilizado nesses casos, segundo Valério, é o acordo de sócios. “O documento se presta justamente para colocar no papel quais são os principais pontos que os sócios definirão e quais os instrumentos e as regras em três níveis: para a gestão da empresa, para a gestão da relação entre os sócios, para a relação dos sócios para com a empresa e dos sócios para com os familiares”.

Dessa forma, de acordo com o especialista, ao seguirem regras claras, estabelecidas por um conselho maior, torna-se mais fácil lidar com as divergências internas e saber que não é a opinião do outro que vale, mas sim, um estatuto elaborado de forma a gerir todas as ações, metas e resultados em benefício da empresa familiar.

Como a governança corporativa pode estruturar uma PME?

As pequenas e médias empresas são um nicho importante no mercado brasileiro. De acordo com dados recentes do SEBRAE, elas representam 27% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional, o que demonstra a força do empreendedorismo no país. Muitas dessas empresas são de origem familiar, ou seja, possuem membros da mesma família na administração dos negócios. Segundo informações da Pesquisa de Empresas Familiares no Brasil, da PricewatehouseCoopers (PwC), divulgada no fim do ano passado, as empresas familiares representam 80% das 19 milhões de companhias do país. Os números expressivos chamam a atenção e levantam um questionamento: como uma empresa de pequeno ou médio porte se estrutura para competir num mercado tão acirrado?

Para Eduardo Valério, diretor-presidente da GoNext Family Business, especializada em gestão de negócios e implantação da governança corporativa na empresa familiar, ter um modelo de gestão empresarial é importante para qualquer empresa, independentemente do tamanho. Porém, no caso das PMEs, a boa governança tende a ser um passo ainda mais importante para a estruturação do negócio. E se engana quem acha que esse serviço está aquém das possibilidades de pequenos empresários. “Percebemos que esse grupo é um dos que mais têm buscado o trabalho de governança corporativa, que é totalmente personalizado e adaptável à realidade de cada um. Na GoNext, cerca de 70% dos projetos atendidos são de pequenas e médias empresas. Estimamos que, de dois a quatro anos depois da implantação da governança, essas empresas apresentaram crescimento médio anual de 15%, solidificando sua posição no mercado”, afirma Valério.

Entre os benefícios trazidos pela governança corporativa aos pequenos empresários estão a estruturação de um plano de negócios claro e objetivo, que irá direcionar as metas da empresa, bem como as ações que seus dirigentes devem praticar para atingí-las; o estabelecimento de valores na gestão; a definição dos papeis, direitos e deveres de cada um que atua na empresa; além de estabelecer métricas de monitoramento e avaliação, que possibilitam um controle maior da geração de lucro e da administração do fluxo de caixa. Isso tudo, segundo Valério, permite que a PME torne-se estruturada e ganhe competitividade, sem cair em erros comuns.

Empresa familiar: mera herança ou degrau para expansão?

Não é segredo que, para progredir, toda empresa precisa de um bom sistema de gestão e, principalmente, um gestor preparado para liderar pessoas e conduzir o negócio. Nas empresas familiares, em que muitas vezes os membros da família se dividem na ocupação de cargos existentes na companhia, esse cenário pode se tornar confuso. Principalmente quando os sucessores ainda estão se preparado para assumir novas funções. Com isso, a alternativa cada vez mais utilizada pelas empresas familiares é a contratação de gestores externos, fora do círculo familiar.

Para o diretor-presidente da GoNext, especializada em gestão de negócios e implantação da governança corporativa na empresa familiar, Eduardo Valério, a profissionalização das companhias pode trazer vários benefícios, desde que seja bem estruturada. Segundo ele, entre as vantagens de trazer um profissional com experiência de mercado à empresa familiar estão “a oportunidade de deixar o sucessor se preparar e ter a chance de escolher se quer assumir o negócio ou não; a geração de valor e de credibilidade da empresa perante o mercado”.

A profissionalização é uma tendência. Entre os projetos atendidos pela GoNext, a estimativa é que 25% das empresas familiares contam com gestores externos na administração dos negócios. Valério aponta que entre os principais motivos para trazer um profissional de mercado à gestão estão a falta de interesse dos sucessores no cargo ou inexperiência na função pretendida e um grande intervalo de sucessão, que pode gerar um distanciamento de gerações, com herdeiros ainda muito jovens para gerir a empresa.

Seja qual for o motivo para optar por um executivo de mercado, é importante fazer com que a entrada desse profissional seja realizada de forma responsável. De acordo com Valério, o executivo precisa, comprovadamente, ter experiência no cargo e estar preparado para que, possivelmente, sua passagem pela empresa seja breve. O especialista afirma que não é raro ver que, após um determinado tempo, um ou mais sucessores sentem-se preparados para assumir a direção dos negócios, colocando em cheque o cargo de liderança do profissional anterior. “Caso o herdeiro retorne ao cargo ou opte pela gestão mista, quem ganha com isso é a empresa familiar, que se torna mais sólida e estruturada para continuar atuando no mercado de forma sadia e bem controlada”, avalia Valério.

Sucessão é ponto crítico em empresas familiares

O processo de sucessão costuma ser um ponto crítico em empresas familiares. Em muitos casos, o herdeiro não possui um preparo adequado para assumir o controle da organização. Em especial em situações inesperadas, como a morte do controlador da empresa. Repentinamente, o novo gestor se vê diante de diversos desafios, tanto estratégicos, quanto operacionais. E seu posicionamento nestes pontos é crítico para os rumos da companhia.

Uma pesquisa realizada pela PricewaterhouseCooper (PwC), em 2016, mostra que apenas 19% das empresas familiares brasileiras têm um plano de sucessão. Por isso, Eduardo Valério, diretor-presidente da GoNext, especializada em gestão de negócios e implantação da governança corporativa em empresas familiares, chama a atenção para o fato de que, sem ter sido adequadamente preparado, o sucessor enfrenta muita dificuldade em fazer um processo de decisão consistente. “Em situações assim, é comum que as decisões não sejam compartilhadas com outros diretores, podendo ter resultados catastróficos”, alerta.

Justamente nestes casos é preciso ter uma diretoria forte e um Conselho de Administração que possa ajudar muito neste processo de transição da empresa. “O Conselho de Administração é o órgão chave nestes casos. É nele que o novo líder vai encontrar respaldo para os seus processos decisórios e também para as críticas, além de evitar que se tome decisões equivocadas na organização”, diz Valério.

Com experiência de acompanhamento de várias empresas nesta situação, Eduardo Valério explica que o ideal é designar um diretor que não é da família como diretor geral ou CEO por um prazo de transição. Ele será o mentor do sucessor ou dos sucessores deste processo, assim como também, pode ser o representante do Conselho de Administração durante a vigência do processo sucessório. Este cenário é comprovado pela pesquisa da PwC, que aponta que 69% das empresas familiares têm membros de fora da família no Conselho de Administração.

Existem também os casos em que a velha geração opta por deixar a empresa, mas a nova geração ainda não tem a devida preparação para assumir. São situações mais tranquilas do que a substituição inesperada por falecimento. Deve ser feita uma avaliação interna dos possíveis sucessores, buscando-se no mercado um profissional para gerir a transição.