Por João Nascimento, sócio do escritório de advocacia SV LAW
Em setembro do ano passado, publicamos um artigo chamando a atenção para os possíveis impactos que uma eventual adoção, pelo Banco Central, do modelo de Open Banking europeu, teria na indústria brasileira de serviços financeiros.
De lá pra cá, pudemos observar um crescente interesse dos players do setor em entender e se preparar para esse eventual cenário, onde a forma como se dá o relacionamento dos clientes com os seus bancos muda radicalmente.
É claro que o Banco Central não só monitora como o Open Banking está sendo implementado na Europa, como também tem sido instado a se manifestar (ainda que em foros mais reduzidos) sobre um possível marco regulatório sobre o tema, que certamente terá um impacto profundo na dinâmica de diversos mercados, em especial, nos de crédito e pagamentos.
Mas o curioso é que, de uma certa forma, um dos pilares do Open Banking, tal qual implementado na Europa, já se encontra regulamentado no Brasil há algum tempo, por meio da Resolução do Conselho Monetário Nacional (“CMN”) nº. 3.401, de 6 de setembro de 2006 (“Res. 3401/06”), que alterou a Resolução do CMN nº 2.835, de 30 de maio de 2001 (“Res. 2835/01”).
Essa norma, que se encaixa no contexto geral da agenda do Banco Central de “empoderar” os cidadãos, facilitando a portabilidade de serviços financeiros e estimulando a competição no setor, conferiu aos clientes bancários a prerrogativa de obter, diretamente de seu banco de relacionamento, informações extremamente relevantes, tais como:
· dados cadastrais mantidos em razão da abertura de conta-corrente;
· histórico detalhado de operações de crédito contratadas;
· saldo médio mensal de conta-corrente; e
· saldo médio mensal de aplicações financeiras e demais investimentos.
Mas a Res. 3401/06 ainda foi além, ao permitir expressamente que o cliente possa disponibilizar tais informações a terceiros (instituições financeiras ou não), desde que por ele devidamente autorizado (o que é respaldado pela Lei de Sigilo Bancário).
A regra estabelece que as instituições detentoras das informações devem disponibilizá-las ao cliente, ou a quem este autorizar, em até 15 dias contados da solicitação, com base em dados relativos, no mínimo, aos 12 meses imediatamente anteriores àquela data.
É claro que o nível de detalhamento e agilidade no acesso às informações permitido pela sistemática prevista na Res. 3401/06 deixa muito a desejar, se comparada com a realidade de acesso via APIs preconizada pelo marco regulatório Europeu. Mas a regra, tal qual se encontra em vigor hoje, já permite um acesso interessante a informações bastante ricas, especialmente para fins de análise de crédito e de investimentos.
Guardadas as devidas proporções, é como já existisse hoje um “Open Banking Analógico”, meio truncado e incompleto, mas que serve para mostrar, principalmente, que o conceito já está presente na regulamentação, e que é só uma questão de tempo para que se torne realidade.